Há bons tempos eu não visitava minha antiga casa: Porto Alegre. Visitar aquela terra era, para mim, uma necessidade eminente, pulsante, apertada.
Quarta-feira passada fui.
Saí de Curitiba num voo deveras lotado e deveras atrasado. Chovia. Fazia um frio de doer não só o corpo, mas a alma, principalmente quando estamos no Brasil e em dezembro. Era um voo direto, reto, ao sul. De contra a frente fria. Sem serviço de bordo, devido às turbulências de todo o trajeto, vi o Guaíba surgir, no final seus inúmeros braços, que abraçam as ilhas de água doce. E o sol avassalador daquela cidade apresentou-me, mais uma vez, os prédios apertados do centro velho e, ao longe, os morros que separam a zona sul de todo o resto da cidade. Senti o avião planar sobre os viadutos e, em seguida, lá estava em no Aeroporto Salgado Filho.
Saí a pé. Caminhando com minha mala de rodinhas pelas pistas de acesso ao terminal. Subi a rampa que levava a passarela e fui até o metrô. Já eram seis e meia da tarde quando desembarquei no Mercado Municipal e, sorrindo, caminhei por aquela bagunça, aquela sujeira de final de tarde que em qualquer lugar seria abominável, mas no centro de Porto Alegre é uma poesia urbana única, tocada pelos poetas que lá vivem e viveram.
Deixar as malas no Hotel era apenas protelar a visita à Casa de Cultura Mário Quintana.
Lá, em menos de meia hora, vi tango, vi teatro, vi fotografias, vi o quarto do poeta. Peguei meus papeizinhos com roteiros e espetáculos e saí em disparada à Lima e Silva. Eu precisava ver aquelas pessoas que habitam os bares ao final de tarde. Mas antes, por meu instinto humano, fui visitar a rua em que morei, uma das mais importantes e famosas de Porto Alegre: a Fernando Machado. Onde morou, também, alguns séculos antes de mim, o maníaco do Arvoredo, lendário assassino. Tudo estava igual. Assim como na Lima e na Rua da República. Os mesmos bares, as mesmas pessoas estranhas e sorridentes.
Passei quase uma semana pela cidade. Fui ao Teatro de Arena. Fui à Palavraria, na Vasco. Fui rever alguns amigos. Caminhei até ter bolhas nos pés.
Fui ao Parcão, o Parque Moinhos de Vento, onde tirei fotos, vi os cachorros e sentei um pouco na grama, para celebrar a música da Cidadão Quem, a banda gaúcha que mais gosto.
Conheci, por ali, um café chamado Domitila, onde, ao chegar, você sempre é recebido com pétalas de rosas jogadas ao ar. Lá voltei duas ou três vezes durante minha permanência, sempre provando do café da água com gás, servida com hortelã.
No domingo, último dia de viagem, passei horas sentado num banquinho no Parque Farroupilha, depois de visitar a feira de artesanato. Ali observei os cachorros e os humanos. Ambos curiosos em suas particularidades. Comi um cachorro quente na Lancheria do Parque e adormeci. Acordei muito sonolento e, quando me dei conta, chegava a Foz. Aqui eu moro. Aqui eu amo viver. Mas, confesso, uma parte do meu coração teima em doer de saudade daquelas bandas. Com saudades dos quitanares de Quintana. Com saudades lindas de Porto Alegre.
* Luiz Henrique Dias é escritor, membro do Núcleo de Dramaturgia do SESI. Escreve todas as quartas nesse espaço onde discute a cidade e o homem, com doses homeopáticas de poesia. Para ler mais acesse www.blogdoluiz.com.br ou siga ele no twitter @LuizHDias.