Aqui de cima dá pra ter uma outra visão de São Paulo, das suas casas, lojas, fabriquetas de fundo de quintal. Vejo uma outra paisagem, escondida para muitos, anônima para outros, por entre dezenas de andares de prédios – lares modernos lares. As paisagens também se formam com as nuvens, num azul celeste que vai se ofuscando no horizonte cinzento da terra que já não se banha da garoa. Observo cúmulos carregados, engraçados, que disfarçam a poluição dos milhares de escapamentos de carros, e permitem a descoberta do céu das andorinhas, das pombas, dos periquitos, dos urubus e gaviões, que se defendem por entre helicópteros e até balões.
Também vejo as pessoas de outra maneira. Aqui de cima, parece que correm mais, se esforçam para chegar primeiro, avançam semáforos vermelhos. Precisam ultrapassar, estar na frente, vencer. Vencer o quê? Escuto barulho por todos os lados: ora, este é o desenvolvimento acelerado! As pessoas lá embaixo pensam: ah, que belos ruídos da britadeira, que som maravilhoso dos martelos e das furadeiras! Olham para todos os lados, concreto, aço, ferro e, claro, progresso! Não sei como, nem por que, mas acreditam que podem chegar lá! Muitas nem ouvem, outras não enxergam, mas sobrevoam sobre as pessoas aquelas máquinas voadoras que me lembram tubarões rondando no mar – são os milionários empresários! Tão ou mais vorazes do que os parecidos predadores quando famintos. Na terra do concreto, dizem, mata-se um leão por dia!
Para muitos não há céu, nem nuvens, nem estrelas, nem sol, nem lua, nem montanha ou paisagem. A não ser quando são surpreendidos, na sua acelerada rotina, por engarrafamentos não esperados, ocasionados pela chuva poluída!
Ah, domingos e feriados, que maravilha de lugar, que belo o canto das aves logo ao amanhecer, que belo o som do vento na janela, confundido em outros dias com o barulho de aeronaves, trens e carros, muitos carros com suas buzinas!
Nesses dias, aqui de cima – tenho uma sacada – olho para as ruas vazias e penso: onde estarão aqueles transeuntes de passos apressados e duros? O que estarão fazendo agora os motoristas e motoqueiros acelerados, à luz da manhã de primavera, aos sons agudos do bem-te-vi, no incômodo sossego do silêncio da cidade grande (para alguns), na oportunidade de reflexões e aconchego para aqueles que sobrevivem à hipnose coletiva da sociedade da mesquinharia?
São Paulo, Setembro de 2007.
Angela Tischner nasceu em Foz. É bióloga e educadora ambiental. Começou a se arriscar nos versos, poemas e crônicas há alguns anos, quando morou em São Paulo. Lá escreveu o livro infantil: “Vó, tem um tamanduá no meu sonho!”, pela Editora Biruta. Atualmente é vice-presidente da Academia de Letras de Foz do Iguaçu e se dedica a poemas que em breve estarão publicados.