Um dos sentimentos mais relavantes ao ser humano sempre foi o pertencer.
Por tempos, vivemos em função de nossos grupos, de nossos meios e de nossas relações interpessoais. Mas sempre foi na cidade, e no país, em menor grau, que tal sensação, sentimento, melhor se expressou.
Essa relação, do homem com sua Terra, seja ela de nascimento ou de escolha, foi chamada de Topofilia, e pôde ser entendida (grifo meu) como a amor ao local, a cidade.
Isso explica o porquê de tantas pessoas, mesmo com os diversos problemas, nunca terem aberto mão de viver em suas cidades de origem (ou de escolha, eleita para viver) e, mesmo distantes destas, mantiveram um olhar crítico e preocupado acerca dos problemas sociais/urbanos.
Sinto, e eis o motivo dessa reflexão, algo mudar.
Tenho percebido, através da literatura de urbanismo, ou mesmo através do cotidiano, expresso em jornais ou em palavras, uma fragmentação do sentimento de Topofilia, em especial nas grandes cidades brasileiras.
A questão, no entanto, é: quando os problemas da cidade extrapolam a capacidade individual de oferecer soluções, as pessoas passam a perceber a cidade, sua cidade, com outros olhos? Ouvimos, Do que adianta não jogar lixo na rua se muitas pessoas assim o fazem? Do que adianta sair na rua à noite para ver a cidade – e ouvir seus sons – se há violência? Do que serve dar bom dia às pessoas se todos estão ocupados? Ou seria algo de nosso tempo?
Assim, vivendo em um individualismo, mesmo forçado, a cidade vai perdendo seu status fílico e tornando, apenas, um lugar de sobrevivência. E isso é triste.
Le Corbusier falava da Rua como lugar de convivência.
Hoje a Rua tornou-se terra sem dono, sem Lei. E não falo na Lei, no Crime, na Violência. Falo nas Leis de convívio, também. Não se olha, não se abraça, não se cumprimenta. Apenas se vive, e se convive.
Na foto que uso para ilustrar este texto, tirada por mim há alguns dias, na Avenida Paulista (área nobre de São Paulo), uma pessoa trafega na faixa de ônibus na contra-mão. Seu trabalho? Coletar objetos descartados. Eis que acompanhei seu movimento por alguns minutos. Era como um fantasma perambulando pelo mundo, cruzando milhares de pessoas, de afazeres, de trabalhos, e nada de ser notado. Creio que somente minha câmera viu, pois ela têm vida própria em alguns instantes.
Amigos, esquecemos das cidades, ou estamos esquecendo aos poucos.
E isso é muito triste.
E como recuperar?
(pausa)
Sinceramente, não há como.
(inspira-se, aqui)
Não nesta nossa relação contemporânea: redes sociais, individualidade extrema, etc. Somos cada vez mais fechados em pequenos grupos de interesse "eu posso te oferecer isso, você pode me oferecer aquilo, assim, estabelecemos uma amizade, um contrato de amizade."
Assim, a cidade, e a Topofilia, vão perdendo sua cara, seu jeito, o amor que temos por ela.
Logo, num mundo globalizado, seremos todos iguais, as cidades serão iguais.
E não acho que isso é ruim.
Mas não sei, também, se é bom.
Não mais pertencer.
O signo do atual é não saber.
É, apenas, viver.
* Luiz Henrique Dias é escritor. Siga ele no Twitter: @luizhdias