Cresce, no país, o número de pessoas sensibilizadas com a necessidade sair da individualidade e atuar como protagonista coletivo, debatendo sua cidade, seu estado e seu país
Desde a redemocratização, na segunda metade da década de 80, o Brasil vem consolidando a participação popular como a base do processo decisório. Tal afirmação surge da percepção de uma maior noção de coletividade – apesar de ainda precisarmos avançar muito – aprofundada nos últimos anos com a criação dos conselhos e dos fóruns de debate participativo e, mais recentemente, a partir da ampliação do acesso à internet e da adesão em massa às redes sociais e a outras formas contemporâneas de expressão da coletividade cidadã.
Por muitos anos, ouvimos nos discursos, em especial nos de tom mais conservador, frases como "nossa democracia é muito nova" e "o Brasil ainda não sabe ser democrático". Porém, quase três décadas depois do fim da ditadura militar e da criação da Constituição Cidadã, além de o país seguir à sétima sucessiva eleição direta para Presidente da República, é possível afirmar ter chego o Brasil num nível de maturidade democrática suficiente para colocar todos – inclusive a população "anônima" – a frente dos processos de decisão, não somente com o voto de dois em dois anos, mas também com direito à voz e controle social.
Muitos brasileiros perceberam, no final da década de 90, o embrião desse novo momento, e tomaram frente na organização do que hoje podem ser chamados Conselhos Participativos. Diversas áreas, como saúde, educação, orçamento, cultura, direitos da criança e do adolescente, negros, mulheres, LGBT e segurança pública, dentre outras, começaram a ter seus temas discutidos em fóruns populares e estes foram, aos poucos, ganhando relevância e reconhecimento social, ao ponto de serem institucionalizados nas três esferas de governo, seja de forma consultiva ou, até mesmo, deliberativa. Tal processo de institucionalização atingiu seu ápice de caráter legal em 2014, com a criação da Política Nacional de Participação Social, tendo com próxima etapa, a organização dos cidadãos.
Mas é inegável ter a participação se difundido definitivamente no Brasil a partir do crescimento no número de acessos à internet e com a entrada na vida dos cidadãos das chamadas Redes Sociais, em um primeiro momento através do "ativismo de sofá" e, a partir das manifestações de junho de 2013, levando às ruas milhões de brasileiros até outrora anônimos ao processo de debate social, numa fase de materialização das demandas virtuais.
Mesmo havendo críticas ou dúvidas quanto ao grau de entendimento do processo político-democrático por todos aqueles que estiveram nas ruas em 2013, é notória a importância daqueles movimentos no sentido de dar a quem estava à época a frente do Poder um aviso claro de estar o país passando por um aprimoramento democrático, em grande parte fruto das transformações sociais da última década.
Hoje, é possível perceber também movimentos de participação popular através de grupos de controle de gastos públicos, sites de transparência na política, encontros de segmentos (organizados de forma espontânea e muitas vezes sem motivação político partidária), organizações sem fins lucrativos e coletivos, como os de cultura, de direitos e de esporte e lazer.
O Brasil passa por uma nova fase democrática, repleta de possibilidades e com um espírito jovem e de mudança. Cresce, no país, o número de pessoas sensibilizadas com a necessidade sair da individualidade e atuar como protagonista coletivo, debatendo sua cidade, seu estado e seu país. Tal crescimento, porém, deve ser bem pensado e estudado, para garantirmos ao país um novo momento social e político, com maior controle cidadão sem, no entanto, abrir brechas para pensamentos anti-democráticos, e entendendo que um país global, justo e democrático, governado com base na ética e na transparência, só pode ser construído a partir de voz popular e dos olhos atentes e bem abertos.
* Luiz Henrique Dias é escritor. Siga ele no Twitter: @luizhdias