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O empresário e as horas de espera na fronteira com a Argentina

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Foto: Arquivo

Há muitos anos, em toda a alta temporada ou em feriados prolongados, enfrentamos o mesmo problema: as intermináveis filas e horas de espera para cruzar a fronteira com a Argentina.

Desde junho de 2008, os turistas dos países que compõem o Mercado Comum do Sul, o Mercosul, podem apresentar apenas a cédula de identidade nas viagens realizadas nos locais que formam o bloco. Não é preciso levar passaporte nem visto de entrada.

A decisão do Conselho do Mercado Comum (CMC), órgão decisório do Mercosul, visava facilitar o trânsito de cidadãos para aprofundar a integração regional. Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai são os países fundadores do Mercosul, já Chile, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela integram o bloco como associados. 

Para turistas brasileiros, os documentos aceitos para cruzar a fronteira dos países que compõem o bloco e países associados são: Registro de Identidade Civil, Cédula de Identidade expedida por cada Unidade da Federação com validade nacional. Estrangeiros com residência legal no Brasil precisam apresentar Cédula de Identidade de Estrangeiro expedida pela Polícia Federal e Passaporte.

Para facilitar o trâmite migratório dos brasileiros, especificamente na fronteira entre Brasil e Argentina em Foz do Iguaçu, o governo argentino aceita também como documento a Carteira Nacional de Habilitação (CNH), porém, apenas para os brasileiros que pretendem permanecer dentro do limite da faixa de fronteira, podendo avançar até 50km no território argentino.

Os transtornos causados aos turistas pelas imensas e demoradas filas para atravessar a fronteira com a Argentina em dias de grande movimento, já não são novidade aqui na fronteira. Mas, neste último fim de semana, um turista em especial decidiu fazer um desabafo em suas redes sociais e acabou levando a discussão deste problema regional para todo o Brasil.  

No sábado, 13, o empresário Luciano Hang, co-fundador e proprietário de uma das maiores redes de lojas de departamento do Brasil, esteve em Foz do Iguaçu visitando as duas filiais que mantém na cidade. Com o fim de seus compromissos profissionais, decidiu atravessar a fronteira para jantar e degustar da boa e conhecida culinária argentina. Ele só não contava com a imensa fila de veículos que seguia rumo ao país vizinho naquele horário e após aproximadamente duas horas de espera, desembarcou do veículo que o transportava e fez uso de suas redes sociais para divulgar um vídeo criticando a, segundo ele, burocracia argentina.
Veja o vídeo:

 

É muito comum ouvir – ou ver e ler – críticas de brasileiros ao sistema de imigração e sua “lentidão”. Porém, apontar o governo argentino e seu sistema como culpados da lentidão, é no mínimo um ato precipitado, que originados de um “brasileiro comum”, até passariam despercebidas, mas definitivamente, não dá para concordar ou deixar passar despercebida uma crítica rasa como a que se pode verificar no vídeo, proveniente de um notório e bem sucedido empresário que aparentemente tem fortes laços com o governo federal brasileiro e total conhecimento do sistema.

FATOS QUE O BRASILEIRO PRECISA SABER ANTES DE CRITICAR A ARGENTINA

O sistema de controle de imigração utilizado na aduana Argentina, em Puerto Iguazú na fronteira com o Brasil, em Foz do Iguaçu, é um dos mais modernos da América do Sul, passou por mudanças no último ano e, em breve, deverá funcionar em conjunto com o sistema brasileiro, após a implantação dos “e-Gates” do lado brazuca da fronteira.

O sistema deles, aliás, funciona muito bem e, interligado a outras bases de dados como a da Interpol, impede que dezenas de estrangeiros com histórico de antecedente criminal provenientes de diversas partes do mundo ingressem em território argentino diariamente.

Num passado não muito distante, basta lembrar que, graças ao rigoroso controle aduaneiro argentino, foi possível localizar na Itália, o ex-diretor de marketing do Banco do Brasil, Henrique Pizzolato, que após receber informações privilegiadas, fugiu do Brasil – dois meses antes de sua prisão ser decretada – utilizando o passaporte de seu irmão. Depois de ser dado como foragido da justiça, sua foto foi inserida no sistema da Interpol e através de sua imagem, que ficou registrada na Argentina, foi possível descobrir seu paradeiro.

A rigorosidade e a eficiência do atual sistema de imigração argentino vem mantendo a cidade de Puerto Iguazú com o menor índice criminal dentre as três cidades que formam a região da tríplice fronteira.  

Mas, não é a rigorosidade do sistema que vem causando toda essa “lentidão” na travessia da fronteira. Acontece que o sistema moderno dos argentinos não prevê o uso de um documento tão “arcaico” quanto o nosso Registro de Identidade Civil (RG). Os cidadãos argentinos utilizam o Documento Nacional de Identificação (DNI) que é confeccionado como um cartão bancário, faz uso de chip que contém todas as informações do cidadão e pode ser lido pelo sistema apenas aproximando o cartão da leitora. No Brasil, apenas os passaportes utilizam esta tecnologia. 

Até mesmo paraguaios e chilenos já fazem uso do DNI com chip, mas aqui no Brasil, a ideia de confeccionar um documento de identificação nacional único tramitou pelos setores governamentais por quase meio século antes que uma lei fosse criada, tramitada pelo mandato de três presidentes e, finalmente sancionada.

Aprovada pelo Congresso Nacional em 2017 e sancionada pelo presidente Michel Temer, a lei que unifica todos os documentos de identidade com base nos registros biométricos da Polícia Federal e da Polícia Civil criando um novo documento com chip já entrou em vigor há dois anos, mas na prática, ainda não funciona. O documento ainda não começou a ser emitido para o grande público, apenas servidores federais estão recebendo o novo documento, e ainda em fase de testes. Existe uma previsão que, a partir de 2021 o documento passe a ser emitido gradualmente para a população, mas não será gratuito.

Enquanto brasileiros comuns permanecem sem acesso ao novo documento, a cada novo feriado prolongado e alta temporada, milhares deles enfrentam as filas para cruzar a aduana com a Argentina, onde o servidor do serviço de migrações argentino é obrigado a dar entrada manualmente em todos os dados contidos no documento, o que leva em média um (01) minuto por documento. Cada servidor do serviço de migrações argentino chega a dar entrada em mil (1000) documentos por turno na alta temporada. Se acaso o Brasil já estivesse em uso o documento único com chip, o tempo de atendimento por pessoa cairia para ⅓ (um terço) aumentando para três mil (3.000) o número de documentos que cada servidor conseguiria inserir no sistema.

Luciano Hang tem o direito de se revoltar com a demora? Claro, qualquer um de nós se revolta ao esperar mais de duas horas para cruzar uma aduana para fazer uma simples refeição.
Mas, diante de todo o poder que o proprietário de uma das maiores redes de loja de departamento e atual 11º homem mais rico do Brasil – segundo a Revista Forbes – possui, o mínimo que se espera é que ele busque informações antes de apontar culpados, e agora, sabendo de quem é a culpa, utilize sua influência junto ao governo para acabar com a “burocracia” que ele tanto odeia, a “pouca vergonha” e a “p****** do c***** (sic) que impendem esse documento de chegar às mãos dos brasileiros.

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