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Quando o público comparece


Há pouco mais de uma semana, trouxemos para Foz do Iguaçu um espetáculo teatral. Ao final da temporada, muitas questões foram respondidas, muitos argumentos refutados e muita gente precisou fazer um curativo na língua 

Há tempos o discurso é o mesmo: “falta público”, “não há bons espetáculos”, “a cidade não tem cultura”, “blábláblá”. Ano passado, vimos um Festival de teatro com milhares de espectadores. Eles lotaram as salas, emocionando-se, apaixonando-se, mostrando o quanto nossa cidade precisa e quer opções culturais e artísticas.

Mas eu ainda tinha um pé atrás, pois a entrada era franca e, confesso, amo o teatro, mas não faria de graça, até por uma questão de respeito a mim e ao público. Sou um dos caras de teatro que menos faz teatro nessa cidade, mas é justamente porque cobro para fazer.

Não quero dizer que os grupos que se apresentaram no Festival fizeram de graça. Mas alguém pagou a conta e, certamente, não foi (diretamente) o público.
E isso me incomodava aqui em Foz. Até o último dia 02 de abril.

Claro que não queríamos explorar nosso cidadão, cobrando oitenta ou cem reais por uma entrada no teatro, como fazem por aí, ou enfiando o ingresso goela abaixo dos empresários. Isso é absurdamente ridículo. Um desrespeito. Estipulamos uma entrada de vinte reais, dez para estudantes. Além disso, cito que nossos apoiadores contribuíram muito para a redução de custos e possibilitaram, assim, cobrarmos o valor de “um shawarma e uma coca-cola”, para a meia entrada ou “sanduíche gringo”, para a entrada inteira.

Ao invés de ingerir 600 calorias em dez minutos, as pessoas puderam se emocionar e se divertir em uma hora e meia de peça.

E o resultado foi assustadoramente maravilhoso: mil e quinhentos espectadores em menos de uma semana. Terminamos a temporada com uma apresentação aberta ao público, no Hotel Bella Itália, com uma fila monumental na entrada e toda a produção desesperada para conseguir cadeiras e, assim, acomodar todos aqueles cidadãos iguaçuenses, sedentos por teatro.

Saí convencido da necessidade de criarmos grupos profissionais na cidade. E não falo profissionais em qualidade ou conceito. Isso há! Cito o Grupo do Anglo-Americano, por exemplo. Falo de grupos profissionais em sua totalidade: DRT, salário, registro, capacitação continuada, intercâmbio, representatividade social e política e, é claro, o merecido respeito.

Para isso, é preciso um movimento. Não cultural, mas artístico, crítico e atuante, para mostrar à cidade que estamos aí, vivos e cobrando o ingresso justo pelo nosso trabalho. Ingresso esse que será revertido em aluguel, água, luz, locomoção e, é claro, em mais e mais espetáculos teatrais. Um movimento não cultural, mas artístico, profissionalizado, para mostrarmos ao poder público o quanto precisamos de editais de fomento e políticas culturais sérias, ativas, continuadas. Para mostrar a esse mesmo poder público o quanto é importante regulamentar o Sistema Municipal de Cultura e o Fundo de Financiamento e o quanto também é importante um Teatro Municipal (não um mamute, por favor) e as salas particulares. Um movimento artístico para mostrar aos empresários o quanto é bom para a cidade (e para seus próprios negócios) o investimento na cultura e no marketing cultural.

Um movimento artístico, engajado na política cultural, para mostrar a esse povo pessimista o quanto sabemos o que estamos falando e fazendo e o quanto essa cidade, através de seu público, está reconhecendo da melhor forma possível: indo ao teatro.

Ainda falta muito para sermos a cidade que queremos, mas, trabalhando, a gente chega lá.

 

 


 
 

 

 *Luiz Henrique Dias é dramaturgo, ator e mais monte de coisa. Siga ele lá: @LuizHDias  @LuizHDias (blogdoluiz.com.br)